Elas nas notícias

Maio 2, 2008

Desconstruindo o corpo como objecto de consumo

Filed under: Reflexões — carlacerqueira @ 10:48 am
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Duas notícias deram o mote para a reflexão desta semana. O ComUM noticiou na última edição o aumento da afluência de praticantes aos ginásios da universidade. Aproxima-se o verão e as pessoas querem melhorar o seu aspecto físico. Também tem sido muito mediatizado durante a última semana o lançamento do livro da cantora portuguesa Mónica Sintra. Na obra ‘A um passo do abismo’ a artista conta na primeira pessoa a luta travada contra a anorexia e bulimia…Nesta era de culto do self este tipo de doenças são uma realidade cada vez mais marcante, onde as vítimas continuam a ser sobretudo as adolescentes.

É indiscutível que vivemos numa sociedade de consumo, num tempo de culto da imagem e das aparências, onde o corpo parece que se transformou no mais apreciado dos objectos. Nele está toda a beleza, a qual parece acessível a quem a quiser, transformando o original e criando outro ser, mais perfeito e funcional.

Na sociedade actual, o corpo mostra a sua omnipresença, pois está visível na publicidade, na moda e na cultura de massas. Como bem diz Jean Baudrillard no seu livro ‘A Sociedade de Consumo’, o corpo aparece como um “objecto de salvação” que vai substituindo a função moral e ideológica da alma.

Sujeito às mais variadas metamorfoses, de acordo com os desejos de cada indivíduo, sofre uma pressão contínua. Aumenta a ingestão de produtos dietéticos, a ida ao ginásio, as cirurgias estéticas ou marcas corporais. Procura-se incansavelmente alcançar a perfeição estética, a qual está associada à magreza, à linha e a uma dieta rigorosa. O corpo encontra-se na esfera pública, sujeito ao olhar do mundo. Basta assistir à proliferação de programas televisivos que visam a felicidade no mundo pós-moderno, ou seja, alcançar o corpo perfeito.

Como diz Giddens, vivemos num mundo repleto de opções plurais, mas ambíguas. Escolher entre ser magra ou gorda é escolher entre a integração ou a desintegração social. Isto significa que a beleza esconde-se sob a capa da perfeição, mas arrasta consigo uma repressão severa e constante. Todos ouvimos falar de vários casos de jovens que morreram no processo de criação de um corpo mais magro, conforme com as regras desta sociedade. Todas procuravam cumprir as devoções corporais, mas foram vítimas do culto…deste corpo que rompe com todas as insuficiências humanas.

O corpo torna-se um objecto ameaçador e, por isso é preciso vigiá-lo, reduzi-lo, mortificá-lo e imolá-lo para fins estéticos. Existem mesmo os movimentos ‘pró-ana’, ou seja, a favor da anorexia, os quais utilizam a Internet para chegarem a um número cada vez maior de crentes. Mostra-se apenas o lado positivo do culto, deixando na penumbra as consequências mais terríveis.

E a realidade é que o corpo feminino é o mais erotizado. A mulher emancipou-se e o corpo libertou-se e neste processo ela foi cada vez mais confundida com o seu próprio corpo. Basta olharmos para os anúncios publicitários para vermos que, em muitos casos, os corpos femininos totalmente nus apelam ao consumo de determinado produto. O corpo não está ali para ser vendido no sentido literal, mas para vender, de forma dissimulada, talvez um carro ou uma jóia. Basta lembrarmos o mediático programa de entretenimento da SIC Radical, ‘Nutícias’, em que a apresentadora se despia à medida que nos revelava a actualidade. A mulher, que por tradição cultural está na esfera privada, consegue aceder à esfera pública através do seu corpo, passando de sujeito a objecto de consumo.

Os meios de comunicação vendem-nos a imagem de uma mulher-objecto (temos tantos exemplos…basta ligarmos a Internet ou vermos um pouco de televisão). “Um modelo de mulher assente em tais imagens sugere que o feminino é uma superfície estética e visual, pronta a ser desfrutada visual, mas também eroticamente”, como refere Silvana Mota-Ribeiro. Não podemos olhar para estas imagens acriticamente. O nosso corpo não pode ser apresentado maioritariamente como uma mercadoria…porque não nos podemos esquecer das implicações desta construção social.

 

(Crónica de Carla Cerqueira publicada na versão impressa do jornal ComUM)

 

A propósito, ver O que nos resta? no blogue de Luisa Teresa Ribeiro

Março 28, 2008

Sobem as saias e descem os decotes…

Filed under: Reflexões — carlacerqueira @ 10:33 am
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O jornal Público noticiou, tendo como fonte o diário espanhol El País, que várias enfermeiras espanholas perderam o prémio de produtividade da empresa por não usarem mini-saia. Estamos no século XXI e as mulheres continuam a ser vistas como “objectos decorativos”, como fontes de beleza capazes de atrair clientes. Enfim, elas não têm que tratar os doentes com profissionalismo para obterem o prémio de produtividade, mas têm que mostrar o corpo…Com empresas assim é muito difícil conseguir a igualdade de género…ou será que aos enfermeiros também foi pedido que usassem calções curtos e justos e que dispensassem a camisola durante o horário de trabalho…

Ver a notícia do Público em http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1323725&idCanal=62

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